CASA ARRUMADA
Casa
arrumada é assim: um lugar organizado, limpo, com espaço livre pra circulação e
uma boa entrada de luz.
Mas
casa mesmo, pra mim, tem que ser casa e não um centro cirúrgico, um cenário de novela.
Tem
gente que gasta muito tempo limpando, esterilizando, ajeitando os móveis,
afofando as almofadas... Não, eu prefiro viver numa casa onde eu bato o olho e
percebo logo: Aqui tem vida!
Casa
com vida, pra mim, é aquela em que os livros saem das prateleiras e os enfeites
brincam de trocar de lugar.
Casa
com vida tem fogão gasto pelo uso, pelo abuso das refeições fartas, que chamam
todo mundo pra mesa da cozinha.
Sofá
sem mancha? Tapete sem fio puxado? Mesa sem marca de copo? Tá na cara que é casa
sem festa. E se o piso não tem arranhão, é porque ali ninguém dança.
Casa
com vida, pra mim, tem banheiro com vapor perfumado no meio da tarde.
Tem
gaveta de entulho, daquelas que a gente guarda barbante, passaporte e vela de
aniversário, tudo junto.
Casa
com vida é aquela em que a gente entra e se sente bem-vinda. A que está sempre
pronta pros amigos, filhos, netos, pros vizinhos...
E
nos quartos, se possível, tem lençóis revirados por gente que brinca ou namora
a qualquer hora do dia.
Casa
com vida é aquela que a gente arruma pra ficar com a cara da gente.
Arrume
a sua casa todos os dias. Mas arrume de um jeito que lhe sobre tempo pra viver
nela...
E
reconhecer nela o seu lugar.
Carlos Drummond de Andrade (1902-1987)
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